segunda-feira, dezembro 29, 2008

Exibicionismo

Alanis Morissette estará em Porto Alegre no dia 10 de fevereiro, com o show Flavors of Entanglement, ao qual eu assisti em setembro nos Estados Unidos. Na ocasião, combinei de comprar o ingresso de um cambista por telefone, porque chinelagem é algo universal, e me mandei para o Constitution Hall de ônibus, com o mapa da cidade na mão, com medo de não conseguir chegar a tempo. Era um dia quente, me lembro, uma segunda-feira, e precisei caminhar mais do que gostaria para estar no teatro, já que o transporte público em Washington, D.C. não é dos melhores. Lá, encontrei o cambista e então se foram 50 e poucos dólares do meu orçamento de viagem, gasto que hoje não me provoca o mínimo arrependimento. Havia o risco de o ingresso ser falso ou de a localização ser péssima. Quando entrei naquele teatro lindo, coisa de primeiro mundo mesmo, e vi a cadeira a qual o ingresso me dava direito, fiquei chocada. Eu não estava na primeira fila, mas era quase isso. Localização perfeita. O único porém foi que eu estava ali sozinha, em meio a uma platéia muito desanimada, porque os norte-americanos são um povo sem graça.
Mas agora eu divido um pouquinho da emoção com vocês:





*agradeço aos amigos com os quais falei brevemente naquela segunda-feira à tarde pelo MSN. Eles me disseram algo do tipo “não pensa, vai sim”. Tinham razão.
**eu sempre detestei esse papinho exibicionista do tipo “já assisti esse show no exterior”. Incoerente e bobinha que sou, tive que fazer o mesmo.

sexta-feira, dezembro 19, 2008

Sobre o constrangimento nosso do amigo-secreto de cada ano

Amigo-secreto, todos nós sabemos, é sempre uma furada. Tira-se desafetos, quem te tirou não aparece e não há informações sobre o presente ou então você ganha algo muito desnecessário e é obrigado a fazer cena para agradecer. Nos eventos familiares, devido ao grande número de participantes, corre-se o risco de tirar alguém que passou a fazer parte do clã há duas semanas ou um indivíduo que nunca fez parte, mas é convidado para passar o Natal com o grupo, por caridade.

Apesar de todos os contras, quando chega dezembro, não sei o porquê, me bate uma vontade louca de entrar em todos os amigos-secretos para os quais me convidam. É, eu sempre tive tendência masoquista. Este ano, com a graça de Deus, estou participando de dois, porque os colegas de trabalho me fizeram o favor de promover um amigo-secreto restrito (só o pessoal da diagramação), então eu fiquei de fora, feliz por ter sido vetada (e salva!).

Já providenciei as lembrancinhas para o evento entre amigas e o familiar. Este último promete grandes emoções em 25 de dezembro, já que uma das minhas primas, muito espontânea, deixou vazar, na entrega dos papeizinhos, que não gostou muito do resultado. Então metade dos participantes, que flagraram a revelação, está morrendo de curiosidade. Todos loucos para que chegue o Natal de uma vez. Eu confesso que estou com medo. Se for a felizarda, espero estar com muito clericot na cabeça a esta hora, para apenas dar risada. Porque amigo-secreto é isso mesmo, constrangimento e fingimento (exceto o realizado entre amigas).

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Chega mais, Noel


Caro Papai Noel,

Não sei se fui uma boa menina em 2008. Mas, como eu não sou má pessoa, certamente não provoquei grandes prejuízos à humanidade. Provavelmente tenha sido um pouco egoistinha. É. Talvez tenha brigado mais do que deveria com a minha irmã, com meu chefe, com o namorado. Só que não foram briiiiiiiiiigas homéricas, foram só umas "rosnadinhas". Bem, com a minha irmã foram mais do que rosnadas, mas entre família é assim mesmo que a coisa funciona. Irmão que não briga é um tédio, o senhor sabe. E muita paz faz mal à saúde.

Velhinho, eu chorei um bocado em 2008, principalmente quando passei um mês no Hemisfério Norte tentando entender o idioma que eles falam por lá. Não foi muito produtivo comer porcaria durante 30 dias. E gastei todo o dinheiro da poupança naquelas bandas, mais um bocado do dinheiro da mamãe, tão suado. Me senti egoisitinha. O bom foi que, sofrendo e exercitando o meu lado dramático-nacionalista-xenófobo, esgotei boa parte do estoque de lágrimas, então tenho chorado bem menos, até em épocas de TPM (o namorado agradece). Voltei um pouco adultinha, digamos.

Peço que, em 2009, eu não tenha que me preocupar nem gastar tanto com vazamentos, instalação de ar-condicionado ou conserto do juncker. Foi demais neste ano, o senhor há de convir comigo. Um vazamento no banheiro acabou levando do meu orçamento R$ 500. Consegui comer naquele mês, e olha que nem vendi o corpo. Poupe-me de situações como essa no próximo ano, please. Que os desafios econômicos se restrinjam aos mercados mundiais.



Noelito, estudei menos do que deveria neste ano que se acaba, mas tenho refletido muito sobre em qual curso de pós-graduação devo investir. Prometo concretizar algo em 2009. Eu só tenho 24 anos, vê se dá um desconto.

Agora, o que eu deixei a desejar mesmo foi no quesito "minha contribuição para mudar o mundo". No máximo eu fiz uns discursos por aí, NoelVelho. Ação? Nada. Uma vergonha. Então eu acho que é bem justo tu não caprichar no meu presente, me dar algo bem maisoumenos. Até porque eu ando irritada com essa história de que as pessoas vão gastar uma média de trocentos reais com os presentes de Natal. Economize no meu presente e fuja desta estatística mentirosa, por favor.

Nós dois sabemos que a maioria da população brasileira não tem trocentos reais para queimar em shopping nesta época do ano, aos empurrões e cotoveladas. Essas Câmaras de Dirigentes Lojistas e associações insistem em inventar número que os jornalistas usam em suas matérias mesmo sabendo que tudo não passa de enganação. Vamos lutar contra essa palhaçada, Noelzuco. Juntos.

Então é isso. Você pode me dar um presente meia-boca, porque eu não fiz nada de muito importante para o Planeta em 2008, mas também não me deixa a ver navios, porque eu também não causei grandes prejuízos à humanidade. Com isso a gente boicota as estatísticas, os shoppings e as empresas de cartão de crédito. E no ano-novo estaremos tranqüilos porque não alimentamos o sistema. De repente tomarei uma cidra barata, em uma praia chinela, sem roupa nova nem calcinha amarela! Porque, Noel, em 2009, eu quero simplicidade. Pensar menos em dinheiro e mais em gente. Gastar as minhas energias com o que realmente vale a pena.

Boas Festas e a gente se vê na semana que vem!

Débora Cruz (querendo revolução para 2009).

p.s. Ah, um emprego novo seria muito bem-vindo!


*na foto 1, da esquerda para a direita: Luciana e a boneca nova, meu irmão Júnior, Tio Jorge encarando o disfarce de Papai Noel, meu dindo sentado no chão e eu, acolhida por ele, segurando uma boneca de cabelos azuis, em um dos muitos Natais passados na casa-da-Vó-e-do-Vô.

*na foto 2, Débora Cruz aos 14 anos, fazendo pose junto a ursinhos de pelúcia natalinos em Gramado, faceira na excursão do colégio.

quinta-feira, dezembro 11, 2008

Então eu esperei 24 anos por um presente


É Natal. E de uns anos pra cá esta data tem mexido comigo. Não sei ao certo o motivo. Talvez seja o fato de que a celebração envolve família. E desde que passei a morar em Porto Alegre, o convívio ficou escasso. O coração volta e meia aperta quando penso nisso.

Meu sobrinho já é quase um homem (como eu exagero), meus pais já não têm a mesma vitalidade. Quando reencontro os tios, vejo que o número de cabelos brancos tem aumentado de forma considerável. E eu acompanho tão pouco, aqui, do outro lado do rio.

Bem, mas a questão é que o Natal deixa todo mundo meio sentimental, até quem nunca é sentimental. Hoje é dia 11 e eu já recebi dois presentes referentes à data! Um deles, de uma amiga especial, que é ansiosa e não agüentaria esperar até o dia 25; outro, do meu pai.

Ao visitá-lo no fim de semana, ele me chamou até o quarto, como se tivesse algum grande segredo para contar. Então buscou uma caixinha retangular, estampada com flores verdes e amarelas. Lá fui eu, curiosa. “Isso aqui é pra tu poder tomar chimarrão com uma bomba certa para o tamanho da cuia, pra não precisar ficar usando aquela tua, que é muito grande.”

Ganhei uma bomba de chimarrão linda, feita em ouro e prata, detalhe para o qual eu não ligo muito, mas que o meu pai acha vital. Achei curiosa a escolha dele: presentear-me justamente com algo que nem eu sabia que estava precisando.

Destaco: desde que me entendo por gente, não lembro de meu pai ter me dado algum presente. Sério. Só que eu nunca considerei isso um problema, porque sei que ele é desligado, que não se importa muito com Natal nem com presentes caros em datas criadas para nos levar à falência.

No entanto, admito: a bomba de chimarrão “feita sob medida” me tocou. E eu esperaria mais 24 anos pra ganhar algo tão bem escolhido, tão significativo e ao mesmo tempo tão simples. Natal emociona (tá, pode rir, vai).

quinta-feira, dezembro 04, 2008

Aqui, farroupilha!


No mês de setembro, andava eu pelas ruas e ônibus de Washington, D.C. (eu faço questão de escrever sempre D.C. porque não se trata do Estado de Washington, e sim da capital norte-americana, e eu acho que isso é uma informação importantíssima, embora quase ninguém concorde) a observar o povo e fazer comparações. Bem coisa de quem viajou duas vezes na vida. E um detalhe que eu notei de cara foi que lá as pessoas estão sempre com pressa, muito ocupadas, muito "busy", não têm tempo pra nada. Então é comum vê-las "carregando" o café-da-manhã no ônibus ou mesmo quando caminham pela rua.

Levam um copo de café (meio térmico, meio de isopor, sei lá), com tampa, na mão. Geralmente acabaram de comprar o produto em uma das muitas Starbucks (rede de cafés que é uma praga nos EUA, tem uma franquia a cada esquina) da cidade. Tamanho à la Super Size Me, tipo meio litro. Como eu gosto é de café preto na xícara, não me adaptei àquela água-suja-em-copo-de-plástico-tamanho-família. Mas o bom é que eu olhava para as pobres criaturas e pensava: daqui a pouco eu estarei no Brasil, então não vou precisar ver mais esta gente pálida tomando café fraco em copo gigante. Lembrava dos cafezinhos de padaria, dos de restaurante. O Brasil é lindo. Que saudade.

E aí, de volta a Porto Alegre, eu pego o Rio Branco/Anita (o que tenho feito duas vezes na semana, por sinal) e o que eu vejo? Uma passageira com um daqueles copos de café de plástico com tampinha. Não acreditei. E era do McDonald's o café, pra piorar. Olha, tudo tem limite, principalmente quando o assunto é café, produto brasileiro por excelência. Esta moda de levá-lo no ônibus em copo de plástico não pode pegar. É uma afronta. Eu pensei em falar para a moça do ônibus: "Tu sabe o que significa este copo aí? Tu sabe quantas porcarias os norte-americanos já nos empurraram e a gente saiu comprando? Já não bastam os filmes hollywoodianos? Os lixos da indústria fonográfica? Os reality shows e seriadinhos bestas? Os cremes da Victoria's Secret?".

Acabei ficando na minha, embora não engula essa história e continue com a certeza de que, às vezes, é saudável ser radical. Pra preservar o que é nosso. Pra não vender a alma. Pra dar às coisas, às pessoas (e ao país!) o valor que elas merecem. Café-da-manhã no McDonald's? Aqui, farroupilha!

quinta-feira, novembro 20, 2008

Será que eu sonhei?

O que a pessoa deve pensar quando está trabalhando, às 20h54min de uma quinta-feira, escrevendo uma nota sobre investimentos no combate à dengue no Brasil e no RS, e um desconhecido insiste em ligar, para o telefone comercial, ou seja, da redação, sendo que o único ruído possível de se escutar do outro lado da linha é uma espécie de karaokê: "Uma deusa, uma louca, uma feiticeira, meu Deus ela é demais"?

**seria uma nova estratégia das assessorias de imprensa para tentar emplacar uma pauta?

**leitor descornado?

**minha irmã fazendo pegadinha?

Não sei. Juro.

Vida é mel, dependendo da década


Não são poucos os momentos em que busco na memória o gosto do algodão-doce, tomada por saudade. O mesmo acontece com maçã-do-amor. Só que essas guloseimas-símbolo da infância e dos parquinhos geralmente não cumprem o que prometem quando se tenta ingeri-las na fase adulta. O estômago não suporta tanto açúcar misturado a anilina. As mãos não encontram jeito de permanecer limpas e tudo parece bem mais nojento do que inocente. Tem coisas que a gente não deveria fazer depois que cresce justamente para preservar o encantamento das lembranças.

quarta-feira, novembro 19, 2008

O cinza-chumbo interior


Tem dias em que a gente só deseja poder ficar jogado no sofá, travesseiro fofinho e edredon, trocar o canal da TV 329 vezes, dormir e acordar e dormir de novo. Trocar de canal mais uma vez. E pensar que o mundo gira sem a nossa presença ou participação. Que bom, já que o desejo maior é ficar ali, escondidinho, abafado, sozinho, quieto. Alienado.

Tem dias em que a gente só deseja poder desligar o cérebro por algumas horas, suspender preocupações com o futuro, que é incerto, todos sabem, mas quase ninguém encara isso de alma leve. A minha pesa, principalmente nos dias sem sol, com muita nuvem e breves chuviscos, pingos sem vontade. Nestes dias, parece que nem a chuva vinga. E é então que a gente só deseja se jogar no sofá, desligar o cérebro, dormir e acordar e dormir de novo. Pra de repente sonhar.

terça-feira, novembro 11, 2008

Gentilezas


Se antes achava quase uma grosseria quando você abria a porta do carro, agora enxergo nisso gentileza. E estou precisando de gentilezas. E de palavras doces ao pé-do-ouvido. E de promessas que dificilmente serão cumpridas. Declarações clichês feitas perante o pôr-do-sol, no fim da festa, nós dois caminhando na chuva, sentados no meio-fio como se o mundo não girasse, a tua mão na minha cintura. Mãos dadas, entrelaçadas, grudadas, suadas. Cafuné, qualquer bobagem e a gente ali. Um cachorro-quente e o meu copo vazio. Vem a noite, que é curta, a gente sabe. E bombons no dia seguinte, ou pão de queijo, iogurte, aquela torrada. Bilhetinhos com dizeres bregas, poemas batidos, planos de viagens. Leste Europeu, Cuba, Curitiba ou Pinhal. Juras bobas. Nós dois. Um só. E gentilezas.

sexta-feira, novembro 07, 2008

Vou defender a Luana Piovani



Sim, porque toda mulher passa pela fase eu-tava-sozinha-e-ficar-com-ele-até-que-não-era-tão-mal-então-resolvi-fingir-que-tinhamos-tudo-a-ver-e-podíamos-ser-felizes-só-que-no-final-ele-se-mostrou-mais-ogro-do-que-eu-podia-imaginar. Não condeno. Até porque ela, embora linda de morrer, tem mais de 30 anos, o instinto materno está batendo à porta, é azarada nos relacionamentos e quer ser feliz. Tentou, ao menos. E o Dado, mesmo sendo ogro na décima potência, convenhamos, é gato.
Só não precisava ter escrito algo como “mais uma vez, Deus me protegeu, ia casar com alguém que não conhecia” no que chama de “seu blog”. Menos, né, Lú.

quarta-feira, novembro 05, 2008

O Brasil nunca foi ao Brazil

Eu, em um ônibus pinga-pinga no trajeto Florianópolis-Porto Alegre, tentanto explicar a um londrino mochileiro que a vida na terra do samba não é festa o tempo todo:

- Vocês, brasileiros, não têm o hábito de fazer mochilão, né?
- Bem... é que, pra gente, isso é um tanto quanto caro.
- Pra gente também. Eu juntei dinheiro durante 11 meses pra fazer esta viagem!
- Só que, no Brasil, se você consegue juntar alguns trocados durante 11 meses (considerando um salário de jornalista com contas mensais a pagar), vai no máximo até Buenos Aires. É um pouco diferente, sabe...
- É mesmo?
- Sim.
- Mas o Brasil não é terceiro mundo. Ou é?
- [desisti]

quinta-feira, outubro 23, 2008

Porto Alegre é demais

Pego o Orfanatrófio, sentido Centro-bairro, às 17h40min de uma quinta-feira cinzenta. Todos os assentos estão ocupados. Alguns passageiros, em pé, se equilibram.
O cobrador lê Goethe.
(que momento, hein?)

quinta-feira, outubro 16, 2008

É você e ponto: sobre a delícia e a dor de viajar sozinha


Tiro uma foto em frente à Casa Branca e penso que o meu pai não está ali. Pena. Ele adoraria observar o esquema de segurança, comentaria a arma do policial, o modelo da viatura.

Passeio pelo Museu da Imprensa, entre pedaços do Muro de Berlim, destroços do World Trade Center, homenagens a repórteres que perderam a vida em nome da notícia, fotos que ganharam o Prêmio Pulitzer. Lembro dos amigos jornalistas, os que se formaram comigo, os que conheci no dia-a-dia da profissão, os que ainda aturam aulas na faculdade. Lembro do Guilherme, ele poderia passar um dia inteiro percorrendo os seis andares do Newseum.

Pego um ônibus pra Nova York. "Brincar" nas lojas, experimentar perfumes e maquiagens, andar-andar-andar e não comprar nada. Minha irmã ia adorar tudo isso. E ela está tão longe.

Decido torrar 20 dólares para subir até o mirante do Empire State Building. É quase 1h da manhã. Eu, meu casaco que não dá conta do frio, mais a câmera fotográfica. Teria muito mais graça ver as luzes da cidade de Nova York abraçada ao namorado. E ele está na outra ponta do continente.

Chego no Central Park e dou de cara com uma Oktoberfest. Canecos, bandinha alemã, cerveja em jarra. Confraternizo com desconhecidos, faço amigos, bebo de graça. Mas onde estará a Tatiana Lemos a uma hora dessas? Cadê a minha amiga que sabe tudo de Alemanha?

Volto para Washington, D.C. Vou até a George Washington University, Georgetown University, sedes do FMI, do Banco Mundial. Mamãe ficaria impressionada com os campi, falaria mal do World Bank e do International Monetary Fund. Ela nunca esteve nos EUA.

Show da Alanis Morrissette, show de jazz, show de reggae. Meu primo Matheus, ex-projeto de músico e atual projeto de jornalista especializado em cultura, ficaria louco.

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A dor de viajar sozinha é que dá vontade de compartilhar as experiências com pessoas queridas e elas estão bem longe. A gente constrói uma rede de afetos desde que nasceu e, no momento em que vive histórias maravilhosas, as pessoas que de fato importam não estão por perto. Não tendo para quem se gabar de imediato, o ego, desprestigiado, sem platéia, murcha. Viajar by yourself é como protagonizar um filme ótimo, de um diretor reconhecidíssimo, ao qual ninguém assistirá. No coletiva de imprensa, no pré-estréia, no DVD na locadora. É você e ponto.

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Mas chega de drama, porque a “delícia” da experiência compensa. Além de atuar, você é o diretor do “filme”. Decide onde ir primeiro, se tira fotos ou não, se muda de idéia e troca o destino. Fica mais tempo neste museu, menos no outro. Come o terceiro hambúrguer do dia sem ninguém te lembrar a existência daquela palavra inútil e burguesa: caloria. E toma uma long neck por dia sem que te chamem de alcoólatra.

Por uma questão de sobrevivência, desenvolve o “lado GPS” do cérebro, coisa que não aconteceria se estivesse acompanhada de alguém mais esperto. O momento mais lindo da viagem, no meu caso, foi quando entendi o mapa da cidade e parei de me perder. Um dia até dei informação a uma americana: “Sim, a 18th Street é para aquele lado”. Me achei. Quando compreendi o funcionamento do metrô, outra emocão. Viajando solito, você descobre o seu ritmo, passa a lidar melhor com as limitações, fica mais ágil para todo o resto.

Outra vantagem: aprende-se a fazer amigos com uma rapidez nunca antes vista. Em quatro semanas na capital norte-americana, conversei com desconhecidos na rua, nos bares, nos museus, nas lojas. Como embaixadora do “brazilian way of life”, dei aulas de samba, ensinei os colegas japas a dizer “Oi” e “Casa Branca”, reforcei o mito do Carnaval: “Sim, é isso mesmo, quatro dias de feriado nacional, todo mundo dançado, todo mundo bebendo”. Eles não sabem nada sobre a gente mesmo... que ao menos fiquem com a imagem de que somos alegres.

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Em resumo, o lance de viajar sozinho sintetiza a idéia do “não se pode ter tudo na vida”. Aí dá pra entender por que a felicidade só é completa na ficção. A vida real apresenta ao viajante dor de garganta em meio a passeios, vontade de chorar na hora em que se coloca a cabeça no travesseiro, a mais profunda solidão em meio a cenários dos mais excitantes. Quem aprende a se divertir sozinho mata a charada e vê que o prazer e a dor podem conviver bem. É assim o tempo inteiro na vida, não é mesmo? Bom, ruim, humano, incompleto. E quando o bicho pega, é você e ponto.

quarta-feira, outubro 01, 2008

Eu preciso voltar porque...



*Meu bolso não agüenta mais pagar 5 dólares por uma long neck;
*Cansei de comer com os mendigos no McDonald’s;
*É vital para a minha sobrevivência voltar a comer com garfo e faca de verdade, em prato de verdade (todo dia é essa história de talher de plástico e comida em caixinha de isopor, mesmo nos lugares caros).

Eu preciso voltar porque...
*Esgotei minha capacidade de fazer cinco amigos por dia, todos de países diferentes;
*Ando louca pra atravessar a rua sem burocracia (as pessoas esperam o sinal abrir para o pedestre, sempre! sempre mesmo! mesmo quando não passa carro! que angustia!);
*Pra mim chega de algumas “regras” do tipo: é proibido comer/beber no metrô, é proibido comer/beber no ônibus, é proibido tomar cerveja andando na rua, é proibido, é proibido, é proibido.

Eu preciso voltar porque...
*A grana acabou;
*Cansei de acordar cedo e chegar na aula pontualmente;
*Esqueci completamente que tenho um emprego no Brasil e que ganho em reai$.

Eu preciso voltar porque...
*Não acho bacana ser sempre a que mais bebe e a única que toma cerveja;
*Estou esquecendo o significado das palavras: salto, esmalte, escova, maquiagem, brincos-grandes, roupas-coloridas, colar (a mulherada não pinta a unha, usa chinelo pra ir trabalhar e não põe nem um batonzinho);
*O meu cérebro anda cansado de acordar em inglês, pegar o ônibus em espanhol, depois estudar inglês ao lado de japas, então visitar museus nos quais tudo está escrito em inglês, e chegar em casa, tentar assistir TV, entender apenas 50% e ter raiva das suas limitações.

Eu preciso voltar porque...
*Não gosto de conviver diariamente com o meu lado xenófobo de ser;
*Ando emburrecendo;
*Cansei de explicar que Porto Alegre fica Sul do Brasil e que lá se come carne todo dia e que temos todas as estações e que...
*Ando necessitada de abraços de verdade, música boa, gente que fala alto.

Eu preciso voltar porque, se ficar mais, acabarei igual aos americanos, sem saber o que se passa no mundo, pensando apenas no próprio umbigo, achando normal comer em caixinhas de isopor/plástico diariamente (haja petróleo), respeitando todas as regras. Se eu ficar mais, vou me acostumar com a limpeza das ruas, dos parques, do metrô. Vou me acostumar com a diversidade de restaurantes, de bares, de museus interessantíssimos, de jornais gratuitos, de gente. Vou me acostumar a não precisar pensar em assalto, em acidente de trânsito, em criança sem escola. Vou me acostumar a não lembrar que o mundo é muito mais do que este país. Eu preciso voltar. Ainda bem que eu posso.

quinta-feira, setembro 18, 2008

Vai um abraço aí?


Ainda bem que existem pessoas interessadas em promover momentos de afeto entre desconhecidos. Os viajantes carentes de abraços agradecem.

p.s. Que tristeza se no Brasil nós precisássemos de campanha pra sair abraçando os outros por aí. (a gente é feliz e não sabe)

A vizinha do Bush


A espanhola Concepcion Picciotto faz vigília em frente à Casa Branca, em Washington DC, desde 1981. Ela vive em uma tenda de náilon montada no Lafayette Park, a poucos passos da Pennsylvania Ave, 1600. Ali exibe cartazes a favor da paz mundial e contra armas nucleares. Dá informações a turistas sobre a sua luta, conversa calmamente, entrega panfletos a quem se mostra interessado. Desanimador é constatar que a maioria dos turistas só tem olhos para a imponente White House.

domingo, setembro 14, 2008

Português!


Cheguei à conclusão de que o Brasil não existe. Eu tenho colegas do Japão, Coréia do Sul, Taiwan, Libéria e Colômbia. Tem também um paulista que fala comigo em português quando a gente está prestes a surtar. O professor é coreano, pode?! Em poucos dias de aula tive que ouvir duas vezes: Ah, vocês falam espanhol... Não! We speak portuguese! Ninguém perguntou sobre samba, Carnaval, futebol ou Gisele Bündchen. Nada! Hoje decidi sair com a camiseta do Grêmio pra ver se achava alguns brasileiros. Resultado: percebi que o Grêmio também não existe. Encontrei apenas um brasileiro. E olha que fui a um evento grande, com pessoas de várias partes do mundo, o Adams Morgan Festival. É foda.

Alma latina


Sinceramente? Acho que odeio os americanos e seus lanches rápidos e suas coca-colas. Desde que cheguei, só levei patada. Tá, alguns foram legais, mas os gente-fina são raros. A minha host, por exemplo, no meu terceiro dia na casa, disse que eu deveria comprar um celular, porque a United e outras pessoas estavam ligando para o telefone dela. “Eu tive que atender quatro ligações pra ti hoje”, reclamou. Simplesmente não acreditei. Além disso, ela me passou duas folhas de ofício com “normas da casa”. Só não cortei os pulsos porque tenho uma roommate, a Carolina, que tem me ajudado desde o primeiro dia. Ela é colombiana e está aqui para trabalhar de forma voluntária para a União Européia. Dia desses, sufocada com as regras, com a grosseria dos americanos, com a comida horrorosa que eles comem, e ainda com dificuldades de me adaptar, tive que desabafar, enquanto conversávamos: “Carolina, I am too brazilian, I cry a lot”. Pensei que ela ia me achar uma louca, uma criança. E então ela disse: “I know what is it, I’m too colombian and I cry everyday”. A partir do momento em que abrimos o coração, paramos de chorar. A Carolina talvez não faça idéia, mas ela me salvou. Me levou pra sair com amigos colombianos, me fez companhia em um festival de capoeira (sim, tem até isso por aqui), me ensinou a lavar roupa na máquina maluca da casa. Além disso, fala mal dos americanos o tempo todo, como eu, e ri quando eu falo português (ela acha engraçado quando eu me engano e digo Casa Branca em vez de White House). É uma fofa.

Zé Dirceu: a não-foto

Eu peguei o avião em Porto Alegre às 13h10min de sábado, com destino a Guarulhos. Lá, só fui embarcar para os EUA às 22h10min. Ao menos era um vôo direto para Washington. Cheguei no Dulles International Airport por volta das 7h de domingo. Logicamente, você consegue imaginar como estava a minha aparência a essa altura: uma monstra. Na chegada, estava nervosa porque não sabia o que teria de fazer/dizer na alfândega. E pensava nisso enquanto estava no ônibus que leva os passageiros do avião até o terminal. Eis que olho para a minha direita e quem eu vejo? Zé Dirceu! Com a cara tão ou mais amassada que a minha. Pensei: puxo assunto? Tiro uma foto? Ele pareceu ler os meus pensamentos e fez cara de pit bull. Fiquei na minha. Como a TPM tem sempre a não-entrevista do mês e eu sou imitona, resolvi colocar aqui a não-foto.
Zé Dirceu: eu nem queria mesmo.

Saga

Acho que aprendi muito inglês ligando para o 0800 da United Airlines. Eu entendia pouquíssima coisa do que eles diziam. Foi o caos. Mas vi que call centers são a mesma merda em qualquer parte do mundo. Eles não resolvem o problema, apenas enrolam. Depois de muitas ligações – mobilizei a família no Brasil para infernizar a United também –, a mala apareceu. Detalhe: a bendita foi entregue “aqui em casa” apenas no dia 11 de setembro, sendo que eu cheguei nos States no dia 7. Precisei ficar em casa, esperando que alguém da empresa de delivery aparecesse, então perdi os eventos relativos ao 11/09. Que eu saiba, por aqui houve apenas a inauguração de um memorial no Pentágono. Só. Pretendo ir até lá nos próximos dias.

Amigos


A parte boa da minha chegada foi ser recepcionada por esquilos. Eles são muitos por aqui, principalmente nas redondezas de onde estou morando. Eu olho pra eles e me mato de rir. Parecem macacos, sobem em árvores, galhos, uma loucura. Minha irmã já teria tentado domesticar um se estivesse aqui...

Passado o choque, consigo escrever

Bem, após sete dias nos Estados Unidos estou conseguindo escrever as primeiras linhas. A chegada foi traumática, principalmente porque eu vim, mas a minha mala não. E pior do que cair de pára-quedas em uma cidade completamente estranha é chegar e não ter roupa para o dia seguinte, nem desodorante/xampu/condicionador/sabonete, nem pijama para uma noite decente de sono, nem um chinelinho bagaceiro para pôr quando se está em casa à noite. Depois de três dias com a mesma roupa, me sentindo uma mendiga, sem vontade nenhuma de tirar fotos, fui às compras. A minha “host” me levou ao lugar mais barato possível, um supermercado onde se encontra de tudo, inclusive roupas, tipo o BIG. Comprei uns trapos e as coisas começaram a dar certo.

sexta-feira, setembro 05, 2008

A classe média vai ao paraíso


Após meses de apertada economia que incluiu corte de gastos até com cerveja, chegou a hora. Amanhã embarco para Washington DC, a capital dos Estados Unidos, para estudar inglês e passear tudo que não passeei em 24 anos. Fico com pena de zerar o cofrinho, entretanto, sei que não será um mês “só” de viagem, mas também do mais profundo encontro comigo mesma que já vivi.

Nos meses que antecederam a minha partida, recuperei livros de inglês que usava em cursinhos de idiomas, cadernos. Estavam lá as minhas anotações, rabiscos, temas feitos a lápis. Me deu saudade e raiva de tudo. As muitas aulas de inglês que eu levei a sério não tiveram como desfecho uma temporada no exterior para cursar high school, como eu tanto sonhava. A realidade da classe média em famílias com três filhos não permite tamanho gasto. Simplesmente não sobra dinheiro pra isso – agora, assalariada que sou, eu entendo.

Bem, mas cultivar este recalque tem seu lado positivo (eu sou defensora ferrenha do rancor). A presença de tal ausência fez com que eu planejasse as minhas primeiras férias remuneradas de uma forma, no mínimo, inteligente (dia de auto-estima no topo). Solicitei financiamento materno, zerei a poupança do BB, passei grande parte do ano com a geladeira mais vazia do que o normal (poder passar fome por opção, ô privilégio), estudei o mapa dos EUA para descobrir qual seria a cidade ideal, peregrinei por agências de viagens, batalhei visto, retomei as aulas de inglês. Os bons ventos ajudaram e a empreitada deu certo.

Agora, durante a TPV (tensão pré-viagem), ando arrancando os cabelos só de pensar que vou me perder loucamente pela cidade e arredores, que em boa parte do tempo terei dificuldades graves para entender o que as pessoas falam, que vou sentir na pele toda a minha falta de vocabulário. Talvez chore, talvez reze. E será para exorcizar os momentos ruins e conduzir os bons à posteridade que contarei neste blog tão malcuidado as minhas trapalhadas e descobertas. As aventuras começam a partir de amanhã. Vem comigo!

sábado, agosto 23, 2008

Eu sonhei com Gilberto Gil

Ele deixava um bilhetinho que não era todo azul. E a letra era bem bonita. Dizia “BOA VIAGEM” e tinha dois telefones.

*escrevi isso em 2006 e esqueci de postar

quinta-feira, agosto 07, 2008

Festa de família (para ler em capítulos)


Aniversário de 15 anos em uma cidade do interior: Uma prima vestida para o Oscar, outra com penteado “novela das 8”, a ex-mulher do tio dançando com tiara de diabinha para provocar a atual, metade da festa usando casaco da mesma cor e eu aprendendo a dançar o créu com a prima de 10 anos. É pouco?


Eu preciso escrever sobre o maior evento familiar ocorrido nos últimos tempos, ou melhor, o único evento de peso promovido por membros da minha família até hoje. Uma festa para 400 pessoas no clube mais fino da cidade de Guaíba. Decoração de arrasar, com a temática “borboletas”. Comida ótima, cerveja gelada e vinho para os menos chinelos. O povo todo bem vestido – o meu pai, por exemplo, colocou gravata pela segunda vez na vida. Festa animadérrima, comandada por dois caras que usavam pernas-de-pau e vestiam roupas coloridas. E a aniversariante, linda e loira, que cumpriu o ritual de dançar a valsa e trocou de vestido duas vezes durante a noite. Não é sempre que a província vive um momento desses.

Você aqui!

Ir a Guaíba, pra mim, é como entrar no túnel do tempo. No fim de semana em que o aniversário da minha prima Roberta parou a cidade, eu encontrei meio mundo em uma liquidação de calçados para onde a minha mãe me arrastou durante a manhã (tios, tias e ex-amigas do jardim de infância). À tarde, dei de cara com 60% da ala feminina da família no salão de beleza. Também estavam lá ex-desafetos, como uma moça que roubou um namoradinho que eu tinha aos 13 anos. Fingi que não conhecia. Ela também. Em cinco segundos eu vi a pré-adolescência passar pela minha cabeça em flashes. A manicure me chamou para a realidade (ainda bem).
– Tu vai querer pintar de jabuticaba mesmo? Também tem ameixa, cereja, carmim...
– Isso, jabuticaba.
Lembrei que tenho 24 anos. Ufa!

Chega aí, pode entrar...
A festa foi no estilo “pra não colocar defeito”. Acabei ficando na mesa mais engraçada e eclética: uma prima vestida para o Oscar, com um longo prata invejável; outra de vestido moderno-chique, daqueles soltinhos e com um sinto na altura do estômago (coisa que eu pretendo não usar nunca), com destaque maior para o cabelo, que mostrava um penteado muito “tendência”, parte das madeixas repuxada, parte solta, franja simétrica, meio “novela das 8”, acho. Completavam o quadro um primo que simulava truques de mágica com um guardanapo; a namorada dele, morrendo de vergonha; minha irmã, louca de faceira com o vestido alugado; mais a ex-mulher de um tio que repetia a todo momento “estou sentido energias negativas”, em referência à oponente; meu namorado, atônito com tudo e em dúvida se estava participando das filmagens de algum pastelão; e eu, que aproveitava a gratuidade da bebida.
Minha irmã ficou um pouco preocupada quando percebeu que 40% das mulheres da festa usavam casaco/estola/bolerinho do mesmo tecido e cor que ela estava vestindo (cinza com brilhinhos prateados). Houve breve burburinho. Metade das meninas decidiu que estava muito quente e pendurou o casado na cadeira. Coincidência amenizada.

Tem que ter habilidade
Quando começou o arrasta-pé e foram distribuídos assessórios, a ex-mulher do tio colocou uma tiara de diabinha. Me sobrou um nariz de palhaço piscante. Estava decretado que os limites do bom senso tinham ficado do lado de fora do salão. Inclusive pra mim. Resolvi aprender a dançar o Créu com uma prima de 10 anos que me surpreendeu muito. Achei que ela ainda brincava de boneca. Sabe tudo de funk, a esperta. Eu ando desatualizada. E vi que, de fato, tem que ter habilidade. Essa coisa de descer até o chão, inclusive, não fica bem em todas as idades. Se as primas menores soubessem que eu sou do tempo da “boquinha da garrafa”... O bom é que o meu passado negro, documentado em agendas e fotos, está bem guardado em caixinhas encapadas escondidas no apartamento da capital.

quarta-feira, agosto 06, 2008

Um dia e meio em São Paulo


A minha missão era conseguir o visto para os Estados Unidos, já que pretendo dar um alô para o Bush em breve. Um dia e meio em São Paulo, ida e volta com passagens promocionais da Gol, entrevista às 8h no Consulado. A minha vida em documentos, tudo separadinho com clipes, estava organizada em uma pastinha, a fim de provar que não tenho ligação com grupos terroristas. Antes das 7h Débora Cruz garantiu seu lugar na fila, ao lado de famílias que planejam ir à Disney e executivos que viajarão a trabalho. A tal entrevista, que ocorreu cerca de duas horas depois, após chá de banco, deve ter durado um minuto. Talvez nem isso. Um homem com o sotaque do Henry Sobel, o rabino das gravatas, me fez perguntas através de um vidro. Tive de responder por meio de um telefone! Coisas básicas, do tipo cidade em que pretende ficar, lugar em que trabalha e se tem parentes nos EUA. Às 9h30min eu saí de lá dando pulinhos, após ter ouvido “Visto concedido” e com tempo de sobra para passear por Sampa. Resolvi coordenar os neurônios e pegar ônibus+metrô. Deu certo e cheguei ao Masp, me achando muito sabida – eu tenho dificuldades com “direita” e “esquerda”, com o metrô de São Paulo então... imagine você. O momento cômico da viagem sempre chega. Pelo menos comigo é assim. E, no caso, foi no museu, enquanto eu observava uma escultura. Estava ali, pensando como alguém consegue reproduzir um joelho humano em mármore, meu Deus, é muita genialidade, que coisa, olha a perfeição. Um homem pára ao meu lado. Observa a obra. Compartilha:
- Lindo, né?! Ele demorou dez anos para fazer isso.
- Nossa, incrível.
- Tu é artista?
- Não, não, sou jornalista.
- Ah, que legal. Então eu vou aproveitar para te entregar um release sobre o meu trabalho...
- Sim, claro, obrigada.
Peguei o papel, dei um sorrisinho – devo ter ficado vermelha – e fugi. Segui para outro corredor, ri sozinha, dei uma olhada rápida no material: “Carlos Estigarribia: ator e violinista performático”. Dizia ainda “escritor e dramaturgo”. O resto do texto eu só fui ler em Porto Alegre, um dia depois, no aconchego do meu apartamento e em meio a risadas.
Agora, as conclusões possíveis:
1) Preciso aproveitar momentos como este para aprender a ser cara-dura;
2) Dependendo do ponto de vista, o mundo é mesmo pura diversão.

Vamos celebrar a estupidez humana

Eu precisei parar de trabalhar, respirar fundo e contar até três depois de receber a seguinte mensagem no celular:
“Débora, sou namorada do L.C., que tu ficou um tempo atrás... Faz tempo, pelo que eu saiba, mas queria que tu me respondesse quando foi a última vez que vcs ficaram/transaram. Desculpa te incomodar. Marcella.”
Bem, nem imagino quem seja essa moça. Mas fiquei realmente preocupada com a sede investigativa dela. Não vejo o L.C. há séculos, nunca cogitei ficar com ele. Fomos colegas na faculdade por um semestre. Lembro que ele era meio “Tony Ramos”, com os pêlos saindo pra fora da camisa, essas coisas, e jornalisticamente atrapalhado. Não dá nem pra dizer que éramos amigos. Um conhecido, creio. Pensei em mandar uma mensagem espirituosa pra Marcella, porém fiquei com medo de que ela não entendesse e ainda por cima levasse a sério. O que é bem provável.
Como diriam na minha terra, tem gente que “se presta”.

quarta-feira, julho 23, 2008

"Espelho, espelho meu..."

Existe apenas um caso em que vale apena descer do salto, assumir o lado “de quinta”, jogar fora o código de ética da mulher moderna e, finalmente, destrinchar a vida pregressa do atual namorado: quando a gente descobre que não há limites para a feiúra das ex-namoradas que figuram na biografia dele. E que atire a primeira pedra quem não admite que tal descoberta faz um bem enorme para a auto-estima!

quinta-feira, julho 03, 2008

Quando o "sabe com quem tá falando?" é bem usado

"Não caí de pára-quedas nessa cadeira. Não fui criado em apartamento do Leblon. Não soltei pipa em ventilador, nem joguei bola de gude em carpete. Sou da zona norte, portanto, quero coerência nos depoimentos."

*juiz Marcello Granado, da 7ª Vara Federal Criminal, ao ouvir os militares acusados de entregar três jovens do morro da Providência a traficantes do morro da Mineira.

quinta-feira, abril 17, 2008

Vê se eu posso com isso

Sonhei com Isabella noite passada. Ou com o Alexandre Nardoni, não lembro dos detalhes.
A que ponto a coisa chega...

segunda-feira, março 31, 2008

Casinha do cachorro

Foi na década de 1980. Não lembro ao certo se ela tinha 3, 4 ou 5 anos quando o fato ocorreu. O que sei é que inventou uma maneira inconseqüente e criativa de fugir dos olhos nem tão atentos da empregada responsável por cuidar das crianças e da limpeza da casa. Numa tarde qualquer, se escondeu dentro da casinha do cachorro, que ficava no pátio de chão batido. A rua em frente – cenário de suas brincadeiras com amiguinhas e amiguinhos – era asfaltada, mas calma. Garantia que as crianças por ali ficassem livremente até o anoitecer, sem que os pais enlouquecessem, sem que grandes preocupações os perturbassem. Bem, voltando à casinha: deve ter sido construída pelo irmão mais velho ou mesmo pelo pai. Era azul e de madeira, acho. E grande, já que abrigava um vira-lata de média estatura. A menina lá se abancou, bem faceira, e levou algumas bonecas. Passou a tarde brincando. Enquanto isso, a empregada andava histérica à sua procura pela vizinhança, batendo de porta em porta. Deve ter chorado, tamanho o desespero, evocado todos os santos em orações, feito promessas, imaginado que estaria no olho da rua em poucas horas. A criança sumiu por uma tarde inteira. Deu as caras depois de brincar até cansar, no início da noite, hora em que a mãe costumava chegar do trabalho. Tinhosa, alegremente tinhosa.

Hoje, Luciana, minha irmã, a filha do meio (que sempre achou ruim ser a-do-meio), protagonista desta história real, completa 25 anos. Deu vontade de tornar público um pequeno (mas significativo!) fragmento da biografia dela. Foi a minha parceira de infância. Agora, é companheira de apartamento. Desde sempre, a pessoa com quem travo brigas homéricas seguidas de risos e demonstrações de afeto.

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

A graça de prometer e não cumprir

O ano começa, de fato, na próxima semana. Março. Fim de férias. Pensando nisso me deu vontade de fazer promessas para 2008, com toda a graça de saber que não cumprirei nem a metade. Coisa boa prometer e não cumprir. Mudar de idéia no meio do caminho. Achar que o trajeto é longo demais. Pegar um atalho. Dobrar a esquina sem pensar duas vezes. Tchau, promessa, não te quero mais. E quando algum chato perguntar: “Mas tu não tinha dito que ia...?”. Não, disse coisa nenhuma. Não sei de onde tu tirou isso. Muito capaz!

Se eu fosse uma pessoa séria, prometeria e cumpriria o que segue:

*Periodicidade na academia, três vezes por semana e nunca menos do que isso (com o 2.4 batendo na porta, não há desculpa furada que cole).

*Começar a leitura de “Os Sertões” pela vigésima vez e concluir!

*Agilizar aquela pós-graduação.

*Ligar mais para os amigos que quase não vejo. Ligar mais para os que vejo sempre. Ligar para a minha mãe antes que ela ligue dizendo que eu nunca ligo. Ao mesmo tempo, controlar os gastos com telefone e tentar arrancar algum desconto mensal expressivo da GVT.

*Passar a anotar todos os compromissos na agenda, não contar com a capacidade mental de guardar tudo (sei que não funciona).

*Ir ao cinema com mais freqüência (abandonar a desculpa de que meus horários são "complicados").

*Aumentar a média de livros lidos por mês.

*Assinar alguma revista.

*Lembrar que a poupança do Banco do Brasil não vai crescer se eu continuar escolhendo somente a opção "ver saldo" na tela.

*Beber menos, em alguns casos.

*Beber mais, em outros.

*Começar a gostar de vinho.

*Parar um pouco de ler biografia de gente louca e de ficar afetada com as histórias de vida desse povo.

*Não detestar a psicóloga.

p.s. não olharei este post no final do ano.

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

“Vocês acham que velho não faz Carnaval?”

Ficar em Porto Alegre no Carnaval significa que, se você não for assaltado na primeira noite, poderá encontrar uma noiva de 70 anos no Van Gogh, de branco mesmo, devidamente caracterizada, véuzinho e sandália de salto respeitável para uma jovem senhora. Isso por volta das 3h. Poderá ficar amigo dela e da irmã (de idade semelhante) e receber conselhos sobre como a mulher moderna (!) deve agir com os homens.

Segundo a noiva, que buscava um par, logicamente, e encontrou (!), rachar a conta está absolutamente fora de cogitação. Esqueça o “cada um paga o seu”, recomendou. Mas, por outro lado, é preciso ter a manha. “Tu não pede alguma coisa e faz ele pagar, tu sugere discretamente, dá a entender, e aí ele paga”. Seria algo do tipo: “Ai... como cairia bem uma champagne agora...”.

Se me contassem, eu não acreditaria. No entanto, testemunhei. O “noivo” surgiu, vindo de algum baile da terceira idade, e não pensou duas vezes antes de sentar junto às irmãs setentonas. Pagou champagne, guraná, comidinha. As duas se esbaldaram. Em uma espécie de pingue-pongue-do-amor-livre, hora o noivo estava sentando ao lado de uma, hora de outra, recebia carinhos na nuca e mandava baixar mais bebida. No momento em que a ala vinte-e-poucos-anos decidiu dar adeus aos novos-velhos-amigos, a frase do “noivo” resumiu a noite: “Vocês acham que velho não faz Carnaval?”.

Ok, não acho mais.

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

Progressistas, malucas e sensacionais

Era 1966. Estavam em uma boate no Rio de Janeiro:

Maysa: "Gauchinha de merda, você não canta nada".
Elis Regina: "Não me provoca não, sua pinguça".

Em seguida, voou uma garrafa de uísque. Roberto Menescal a teria segurado no ar, antes que o pesado objeto atingisse Elis.
Maravilhosamente doidas essas duas.

*quem conta é Lira Neto (Editora Globo, 2007) em "Maysa – Só numa multidão de amores"

quarta-feira, janeiro 23, 2008

Eu é que sei, não venha me dizer

Só você sabe se é possível encher um copo de requeijão, uma piscina de plástico, o Guaíba ou um oceano ao reunir todas as suas angústias tolas.

terça-feira, janeiro 15, 2008

Meta para 2008: sentir menos sono, se é que isso é possível

Eu juro que, neste ano, quero sentir menos sono. Para que se tenha idéia da gravidade da situação, sou o tipo de pessoa que dorme até em pé, como os cavalos. Com um sofazinho ou uma cama disponível, aí o estrago é realmente feio. Durmo a hora que for, após ter tomado chimarrão, café ou red bull, com a barriga cheia ou vazia, com sono atrasado ou não, de ressaca... bem, aí nem se fala. Posso até colocar o celular para despertar, mas quando o aparelho começa a fazer aquele barulho desgraçado, aperto o dedo contra alguma das teclas que nunca sei qual é e o som cessa. Até chego a pensar "preciso levantar agora", mas a dormência que toma o meu corpo não permite. Sinto como se mãos ou correntes ou cordas me amarrassem à cama, como nas matérias do Diário Gaúcho em que mães acorrentam os rebentos viciados em crack junto ao
móvel. O problema é que, quando acordo, penso em todas as coisas que deixei de fazer, que estão pendentes, que eu não terei tempo de concretizar depois. E me arrependo por ter tomado o caminho mais fácil. Livros que deixaram de ser lidos, passeios na Redenção que ficaram só no plano imaginário, visitas aos amigos que não foram efetivadas. Eu viveria mais se dormisse menos. 2008, vê se dá uma ajuda: eu tenho tanta coisa pra viver...