quarta-feira, janeiro 28, 2009

As mães e a inocência

Terraço da Casa de Cultura Mario Quintana, no Centro de Porto Alegre, por volta das 16h30min de um domingo escaldante. Na companhia de minha mãe, comemoro a chegada dos pedidos feitos ao garçom:

eu
- Nossa! Eu tava louca por um chope!

ela
- Eu achei que tu ia querer sorvete.

Em nome do bom senso


Depois de ir a 1.327 formaturas, me sinto capaz de dar algumas instruções.

Convidadas:
Favor evitar decotes-sem-noção, roupas levemente transparentes e vestidos que deveriam ser usados na cerimônia de entrega do Oscar. Fica parecendo que a pessoa não sabe que está em uma universidade ou faculdade.

Formandos:
Para os que têm direito a fazer um pequeno discurso quando pegam o canudo, não é muito interessante começar a fala por: "Em primeiro lugar, eu quero agradecer a minha família...", pelo simples fato de que 85% dos formandos farão o mesmo. Favor evitar frases do tipo: “Agradeço o meu pai, que embora tenha todos os defeitos do mundo...”. É formatura e não lavação de roupa suja.

Oradores:
Peloamordedeus, chega dessa história de: "Quem poderá esquecer das festas na casa da Marcinha? E do mau humor do Gabriel a cada manhã? E quando todos foram mal na primeira prova do primeiro semestre da primeira disciplina de seiláoquê?". Ah, por favor, não citem a "pastelina do bar" como uma das maravilhas dos quatro anos vividos na faculdade.

Nas recepções:
Formandos e pais: Não sabem se têm capacidade para discursar? Não discursem. Será melhor para todos.
Convidados: Têm problemas com bebida liberada? Comam antes de beber sem medida. Nunca é demais lembrar. E comportem-se, principalmente se a sua presença é, de fato, relevante para o evento.

Nos bailes:
Para os homens: Não sabem dançar? Não tentem. Bebam. É isso que as mulheres esperam de vocês mesmo.
Para o DJ: Não é todo mundo aderiu à moda “tecno”. Tunti-tunti pode até tocar, mas não a noite inteira. O mesmo serve para funk e pagode. Hits pré-históricos como Whisky a Go-go não precisam ser lembrados.
Para as mulheres: Mesmo que você tenha bebido todas e não saiba mais em que planeta está, dançar o Créu como se ninguém estivesse vendo é constrangedor para todos. Não precisa.

Por último:
Aproveite tudo porque nenhum segundo vivido e sentido neste dia será vivenciado novamente. É uma vez e deu.

terça-feira, janeiro 20, 2009

Gancho


Hoje, quando você ligar a televisão ou der uma olhada nos jornais, entre os assuntos principais estará a posse do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Barack Obama. O cenário é a cidade planejada de Washington, D.C. Aproveitando o gancho da posse mais badalada de todos os tempos, falarei um pouco sobre a cidade – seus prós e contras – e mostrarei algumas das milhares de fotos que bati por lá.

*como escrevi algumas linhas sobre a minha “experiência internacional” e nunca publiquei, os meus dramas também farão parte do texto que segue



“Maior do mundo”

Se o objetivo é tirar uma foto em frente à Casa Branca, outra no Pentágono e a última no Capitólio, um dia em Washington, D.C. é suficiente. Mas se você procura mais que um retrato posado junto aos símbolos do poder norte-americano, precisará de, no mínimo, dez dias na capital dos EUA.



A cidade, que tem cerca de 570 mil habitantes, é linda, limpa, rica em opções culturais e cosmopolita. Foi planejada em 1870, pelo primeiro presidente norte-americano, George Washington, para abrigar a sede do governo.



A grandeza está nos prédios públicos, muitos deles em mármore branco, nas grandes avenidas, nos vários monumentos construídos em referência a grandes líderes da história do país. É sede do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. Para os jornalistas e interessados, uma das grandes atrações é o complexo Watergate.



O que quase não se fala no Brasil é que a cidade tem um número elevado de moradores de rua, os quais, em sua maioria, vivem nas praças e se alimentam em McDonald’s e afins (mendigo fino). Além disso, Washington, D.C. tem um dos índices de homicídios mais altos do país. A região da Casa Branca, inclusive, é perigosa à noite. Parte considerável da população é proveniente de El Salvador – restaurantes salvadorenhos são vistos aos montes. Brasileiros? Quase não se encontra. É uma boa cidade para praticar o inglês. Ou o espanhol.



Há o que fazer?

Sim, e muito. Dezesseis museus gratuitos circundam o National Mall, uma espécie de praça, gramado ou parque. Todos integram o Smithsonian Institute, maior complexo de museus do mundo. O Mall, como é chamado, fica entre o Capitólio e o Monumento a George Washington, um obelisco que está entre as estruturas mais altas do mundo. Muita coisa nesta cidade se intitula “mais do mundo”. It’s the U.S.



Ao redor da praça estão o Holocaust Memorial Museum, National Air and Space Museum, National Gallery of Art, National Museum of Natural History, National Museum of American History, National Museum of African Art e mais uns tantos. Para quem gosta de museu, é programa para uma semana inteira. Além dos gratuitos, existem diversos outros, como o Spy Museum, que conta a história da espionagem, e o Newseum, o museu da notícia, inaugurado em 2008 e que aborda a história da imprensa de forma interativa e moderna.



Vá de táxi

Se os museus são de primeiro mundo, o mesmo não se pode falar do transporte público. O metrô, embora lindíssimo, limpo e mais barato que o de Nova York (quem anda dentro de Washington paga de US$ 1,35 a US$ 1,75), serve principalmente os pontos turísticos e cidades vizinhas dos Estados de Maryland e Virgínia.



Caso a sua programação fuja um pouco disso, terá de pegar ônibus. Esteja preparado para o chá de banco na parada, principalmente no fim de semana. Táxi acaba sendo uma boa opção, ainda mais à noite, já que a cidade tem fama de ser uma das mais violentas dos EUA e só pessoas sem juízo, como eu, se arriscam a encarar o bus às 2h da manhã, na companhia de passageiros mal-encarados.



Nightlife

A vida noturna se divide basicamente entre dois bairros, Adams Morgan e Georgetown. O primeiro, mais popular; o segundo, sofisticado. Por uma questão de afinidade (e também considerando o meu poder aquisitivo), circulei mais por Adams Morgan, que reúne bares e restaurantes étnicos. E adorei. Na primeira semana, fui sozinha ao Ghana Cafe, um bar africano. Tomei uma Heineken a US$ 5 (que dor no bolso), sentada junto ao balcão, ouvindo reggae (concessões que a gente faz quando viaja). Acabei ficando amiga do garçom, um ganense simpático. O problema de uma moça-que-viaja-sozinha-mas-tem-namorado é que só pessoas do sexo masculino se aproximam para conversar. E nunca querem só conversar. O garçom, por exemplo, após alguns minutos de papo sobre futebol e carnaval, começou a dar “beliscadas” na minha cintura quando, entre um pedido e outro, passava por mim. Neste momento, você constata: já bebeu, já treinou o inglês e é hora de picar a mula. Na próxima saída noturna, vai a outro bar.



New York é logo ali

Ir de Washington, D.C. a Nova York é uma barbada. A passagem de ônibus é barata (cerca de US$ 40 ida e volta) e a viagem dura aproximadamente quatro horas. Fui em uma sexta-feira e voltei no domingo, sozinha. É impossível conhecer a cidade em tão pouco tempo, mas dá para garantir uma ida ao Central Park, uma caminhada pela Times Square, uma voltinha noturna no Greenwich Village.



E para quando bater o tédio de estar viajando sozinha, o negócio é “se perder”. Andar e andar.



Foi assim, perdida depois de caminhar quilômetros, que eu dei de cara com uma Oktoberfest animadíssima no Central Park. Sem ingresso, entrei de penetra. E não me arrependo. A festa com os alemães está entre as melhores recordações que guardo da viagem.



Ônibus DC-NY:

Ao menos três empresas diferentes fazem o serviço. Reserve (principalmente se pretende viajar no fim de semana, já que muitas pessoas terão a mesma idéia).

*Washington Deluxe Bus
http://www.washny.com

*Dragon Deluxe
http://www.dragondeluxe.com

*Go to Bus
http://www.gotobus.com/washingtondc

Onde sair:

*Bateu o banzo? O Bossa oferece brazilian music às terças-feiras, com show do grupo Clube do Samba, e não cobra ingresso. No fim de semana, ritmos latinos.

Bossa Bistro & Lounge
18th Street, 2463, NW, Washington, DC
www.bossaproject.com


*Começou a pensar que seria melhor ter ido para a África? Ghana Café, no bairro boêmio Adams Morgan, resolve. Os shows de reggae no fim de semana reúnem gente de Ghana, Gabão, Costa do Marfim etc. Oferece comida e bebidas africanas.

Ghana Cafe
18th Street, 2465, NW, Washington, DC
www.ghanacafe.com


*Restaurante e bar latino-americano Rumba Café: há shows de salsa, tango e às vezes rola música brasileira. Caipirinhas e mojitos fazem parte do cardápio. Não cobra ingresso.

Rumba Café
18th Street, NW, 2443, Washington, DC
www.rumbacafe.com


*Música americana e bandas alternativas? O Black Cat conta com shows de bandas independentes de pop e indie rock. O preço varia de acordo com a atração. É bacana.

Black Cat
14th Street, 1811, NW, Washington, DC
www.blackcatdc.com


Onde comer:
No momento em que enjoar de fast food e o desespero bater, vá ao Vapiano, onde se encontra massa bolonhesa, carbonara, etc, pagando cerca de US$ 9,00. O prato é reforçado.



Vapiano (comida italiana – e boa – a preços aceitáveis)
18th Street próximo à M Street, NW, Washington, D.C.
www.vapianointernational.com


Impressões

Com a desculpa de aprimorar o inglês, embarquei no início de setembro para Washington, D.C. O plano incluía um mês de aulas do idioma na capital dos Estados Unidos (com a missão de aproveitar ao máximo a cidade), mais uma ida de fim de semana a Nova York. As economias de toda uma vida foram aplicadas no projeto – veja bem, não é fácil passar um mês brincando de estudante no antro do capitalismo com o salário que recebem os jornalistas do Brasil. Foram 28 dias de contato com uma cultura nova e nem sempre receptiva. No entanto, a aventura compensa. Ao fim da viagem, acabei deixando um pouquinho de mim em D.C. Ficaram por lá uma penca de medos. Voltei mais corajosa, menos etnocêntrica e louca para planejar a próxima viagem.



The book is on the table

As primeiras tentativas de comunicação em solo estadunidense foram traumáticas. A sensação era de que eu estava na China. Meu inglês “tabajara”, adquirido em cursinhos nada baratos feitos durante a adolescência, não deu conta do recado. E os nomes de tudo em inglês? E quem disse que eu lembrava que chinelo é flip-flop?



Samba? Carnaval? Futebol?

Casa de família. Sim, eu tive coragem de fazer esta opção. E graças a Deus o meu quarto era imenso e distante do resto da casa, o café da manhã era farto e incluía granola, a residência, bem localizada.





Melhor ainda é que não existia uma “família”, apenas a dona da casa, uma ex-professora universitária e atual empresária de 50 e poucos anos, e outra hóspede, Carolina, 26 anos, advogada, colombiana e gente fina.

Ainda no Brasil, havia preparado na minha cabeça, in English, uma espécie de palestra sobre o Brasil: Carnaval, samba, futebol. Ia dizer que a coisa não é bem assim, que as brasileiras não passam o ano rebolando, etc. e tal. Para minha surpresa, a dona da casa não perguntou nada. Nem como foi o vôo. De cara me apresentou os eletrodomésticos malucos da cozinha, me deu aulas sobre como ligar e desligar o alarme cada vez que eu saísse ou entrasse em casa. Eu entendi 60% das explicações. Pânico.

A primeira semana foi o caos. Casa estranha, cidade estranha, pessoas estranhas,comida estranha.



Tudo parecia uma conspiração: o ônibus exige que se tenha o valor exato da passagem. A quantia (US$ 1,35) deve ser depositada em uma maquininha, já que não existe cobrador. E se tu não tiveres o dinheiro trocado? Te ferrou, Parte I. A máquina não dá troco e não liga se tu és turista e ninguém te avisou que seria assim.



No metrô, não há uma tabela, placa ou cartaz informando os preços. E de novo tu tens que inserir a grana em uma máquina para comprar o bilhete – esta dá troco, graças a Deus. Os valores variam de acordo com o destino final do passageiro e com o horário. Na hora do rush, andar de metrô sai mais caro. E para descobrir tudo isso sozinha? Te ferrou, Parte II.

Crééééééu

O curso de inglês, cujo valor eu quase precisei vender um rim para pagar, era (sendo generosa) patético. Primeiro: o professor não era americano, e sim coreano. Segundo: as aulas eram do tipo “leia este texto pouco interessante e discuta com o seu colega”. Terceiro (e mais grave): a professora da parte da tarde trabalhava com músicas e palavras-cruzadas. É sério. No primeiro dia ela apareceu com My Way, do Frank Sinatra. Me segurei na cadeira.

Mas nem tudo é choradeira. A troca de experiências entre os colegas foi riquíssima. Passar quatro semanas convivendo com sul-coreanos, colombianos, europeus e árabes fez o curso valer a pena. Cada dia significava uma aula de antropologia.



Não é sempre que a gente olha para o lado e pode trocar uma idéia com um colega do Iêmen sobre a economia global.

No final de uma das aulas, enquanto eu me gabava sobre quão divertido é o nosso Brasil varonil, citando Carnaval, entre outras mobilizações nacionais – os coreanos ouviam as minhas explicações com brilho nos olhos –, um colombiano chamado Alex me trouxe de volta à realidade.

Ele: – Ah, sim, eu tenho um amigo brasileiro que me mostrou um vídeo esses tempos, uma mulher dançando o “créu” – ao final da frase, um sorrisinho desnecessário.
Eu: – É...
Um buraco onde eu pudesse me enfiar, por favor. O Brasil parece bem mais divertido quando a gente olha de fora. Pensei, mas não disse.



E o planeta?

Sempre fui defensora da harmonia entre os diferentes, da boa convivência entre culturas distintas, mas, de repente, me vi odiando os americanos e seus lanches rápidos e suas coca-colas gigantes. Nos bares, à noite, futebol americano passando na tevê (socorro!). Ao meio-dia, andava quilômetros e não encontrava um restaurante “normal”. Só fast food, sanduíches. Quando encontrei um a quilo, não havia pratos, e sim caixinhas de isopor. Os talheres, de plástico. E foi assim durante todo o tempo que eu passei lá: raros restaurantes de comida a quilo, e, por sinal, caríssimos. Isopor no lugar do prato de verdade, do copo de verdade, da caneca, da xícara do café (aliás, que café bem ruim, hein?). Tudo é plástico, tudo é descartável. Haja petróleo.



Controlar o impulso etnocêntrico não é tarefa fácil. “No Brasil isso é melhor.” No início, repeti esta frase internamente trocentas vezes por dia. Até que acostumei. O ônibus já não era estranho, o mapa da cidade entrou na minha cabeça, fui perdendo a implicância. Então pude aproveitar as vantagens de estar na capital do país mais poderoso do mundo. Museus gratuitos, restaurantes étnicos, bares charmosos. Para cada dia, uma programação. E o estômago pode escolher em que país quer se imaginar: Vietnã, Malásia, Tailândia, Japão, China, Coréia, Índia, Ghana, Etiópia, Rússia, França, Itália, El Salvador, Honduras, México. Restaurantes e mais restaurantes. Coisa de primeiro mundo.









Crise? Onde?

Na metade de setembro, eu já perambulava com desenvoltura por Washington, D.C. Foi quando os mercados internacionais surtaram. Sabe que o pessoal lá não andava tão preocupado assim? Pois é, no Brasil se fala mais no assunto, acho. Os programas de tevê priorizavam as eleições. Os debates estavam em alta. Algumas pessoas me disseram que o povo andava comprando menos, deixando de ir a restaurantes, cortando alguns gastos. E só. Quanto ao 11 de Setembro, mesma coisa. Um dia absolutamente normal. O que houve de mais animado foi a inauguração de um memorial no Pentágono. Nada mais.



No, we can’t

Comer/beber no ônibus? Não pode. Comer/beber no metrô? Não pode. Beber cerveja andando na rua? Não pode. Atravessar a rua fora da faixa de segurança? Não pode. Fumar em ambiente fechado? Nem pensar. Aquele papo do Obama, “Yes, We Can”, é furado. Eles não podem nada, vamos combinar. Para entrar nos bares e beber, é preciso ter 21 anos e documento que comprove. Dirigir pode com 16 anos, né?! Vai entender. De qualquer forma, tenho que admitir: as ruas são limpas, as praças, idem. As placas de propaganda dos candidatos não estão por tudo, como no Brasil.



Lá ocorre uma eleição “clean”, pelo menos em Washington, D.C. Plaquinhas discretas em frente a algumas casas. Nos arredores de onde eu morava, predominavam as de Obama. Em Alexandria, cidade vizinha, no Estado de Virgínia, uma colega me contou que só dava McCain.



É o que vale

Pra finalizar, uma homenagem aos "anjos" que me acolheram e socorreram nos States.

Com a melhor roommate: Maria Carolina Corcione


Com Daniela, que me ofereceu o sofá da casa dela nesta noite


Com Hannah, alemã-amiga que se apaixonou por forró


Com Guelly, boliviana que me levou a um restaurante normal


Com Luciana, companheira de museus


Com Amanda, guaibense como eu


*agora, bom mesmo é voltar para casa e poder tomar uma cerveja no boteco mais próximo, a qualquer hora do dia, na companhia de quem a gente gosta, sem precisar pensar que está fazendo algo errado. o Brasil é foda