domingo, maio 06, 2007

Ana em movimento

O sorriso de Ana não era mais o mesmo e ainda assim ele queria estar ali. Desejava ficar perto dela com a mesma intensidade do dia em que se viram pela primeira vez, num bar em que ela costumava beber com as amigas. Quando o homem magrelo se aproximou com um pequeno papel, ela imaginou a continuação da cena: uma cantada clichê e o número do celular dele. Mas não foi nada disso.
– Oi, tudo bem? Eu sou a “ficha 2”!
Pronto, homem que sabe fazer rir ganha pontos. E foi assim que ele conquistou lugar na mesa das quatro (o que havia sido negado minutos atrás a um quarentão que resolveu importunar as moças) e conquistou também lugar na cama de Ana por três anos.
O que o impulsionou a levantar e tentar a sorte foi o sorriso de Ana. Entre um gole de cerveja e outro, ela ria como se não conhecesse as desgraças do mundo. Tratava-se de uma pessoa completamente entregue a um momento simples, leve e feliz. Ele sentiu necessidade de estar perto daquela felicidade, daquela leveza. Então veio a idéia da ficha, muito bem-sucedida, por sinal, e Ana não dormiu sozinha naquela noite.
Três anos depois, naquele mesmo bar, ela tentava explicar que precisava urgentemente voltar a rir com vontade, como uma alienada! Ele entendia, mas não admitia. Antes, queria o sorriso de Ana. Agora, precisava dela. E o que mais dificultava a felicidade daquela mulher de vinte e poucos anos era saber que ele queria compartilhar o que quer que fosse, talvez até a infelicidade. Pra ela, a vida era outra coisa. Nada de estar junto na alegria e na tristeza, dividir a depressão. Preferia sofrer solteira, até porque as chances de o sofrimento acabar mais rápido seriam bem maiores.
Ana tinha uma necessidade profunda de deixar o sorriso voltar à face, mas a decisão era difícil.
Ainda assim, sabia que tinha ficado com a fatia menor do sofrimento, e que em pouco tempo estaria apresentando outro homem ao seu travesseiro.

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